As redes sociais e o preço da democracia


As redes sociais fazem-me muitas vezes pensar sobre qual é o custo para a sociedade (e muitas vezes, para o indivíduo) da democracia. Antes que me acusem de estar acometido por tendências autoritárias, vamos por partes.
As redes sociais têm aspetos, que, pelo menos à superfície, são positivos: foram criadas pelo senhor Zuckerberg para serem um ponto de contacto entre nós e o nosso meio social (um hub, para soa mais fixe). Permitem-nos criar novas amizades, estreitar as já existentes, convocar-nos para eventos, ou até para galvanizar as massas à ação política (como aconteceu no Egito, em 2011). Não é uma lista completa, mas pelo menos já perceberam que não, em princípio não acho o Facebook mau de todo. É uma boa ferramenta para quem não sabe (ou se esqueceu) de como se fazem amigos. 
Mas, meus amigos, surpreendam-se, também há malícia nas redes!... Por trás do networking e das amizades virtuais platónicas está uma outra insidiosa camada. Refiro-me a dois aspetos fundamentais: a cultura do narcisismo e do voyeurismo, por um lado, as notícias falsas e a desinformação, do outro. Novamente, por partes. 
Se fizermos uma análise por alto do conteúdo das redes, facilmente podemos concluir que a quase totalidade do seu conteúdo é de carácter narcisista e voyeur: as fotos dos pés na praia, os treinos no ginásio, o restaurante no qual só se comeu o prato principal porque não havia dinheiro para a sobremesa, etc. O narcisismo nas redes tem outras nuances, mais subtis, mas nem por isso menos perniciosas. Se esse narcisismo fosse uma pessoa, seria o “intelectual frustrado”: esse indivíduo, cansado da vida, com um trabalho horrível e uma mulher (ou homem) que o odeia, enche o seu muro de Facebook com citações de livros, pensamentos sobre o decrépito estado da sociedade e da economia (ignorando que o mundo sempre foi uma merda, etc.). Disfarçado de conhecimento, este é o tipo de narcisismo mais perigoso das redes e, desenganemo-nos, o “intelectual frustrado” não admite debate, pois ele é dono da verdade absoluta. Há várias nuances do “intelectual frustrado”, mas normalmente são pessoas cujas opiniões não importam, apesar delas estarem convencidas que sim.
Por outro lado, temos a desinformação e as notícias falsas. As redes sociais fazem lembrar o fenómeno natural das cheias, só que em vez de lama, há notícias. Essas notícias, ou lama, como preferirmos, são difundidas por todo e qualquer um nas redes (ou, frequentemente, pelo “intelectual frustrado”). 

A exposição dos aspectos benignos e malignos das redes demandam uma conclusão: as redes sociais são aceitáveis, principalmente se ajudam a propagar mentiras e notícias falsas, se contribuem para agravar o narcisimo em detrimento da fraternidade? Isto leva-nos à questão inicial: qual é o preço que pagamos pela democracia, ou pelas redes, que são a sua congénere no mundo virtual? Pessoalmente, estou convencido que o preço que pagamos é um preço elevado para o que recebemos: o privilégio de uma maioria medíocre exercer a sua liberdade de expressão, inúmeras vezes acima do bem comum. Viver em democracia é o mesmo que andar num autocarro suportando o cheiro a sovaco do passageiro vizinho. Mas é bem melhor do que viver num campo de concentração.


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